motivação.

motivação.

terça-feira, 29 de abril de 2014


    Era domingo, meus planos eram dormir, dormir e dormir. A chuva que caía lentamente me dava cada vez mais certeza de que eu fiz a escolha certa. A campainha tocou, como o porteiro não interfonou, eu já sabia que era Luciana, então nem troquei de roupa e fui abrir a porta. Sabe quando se tem um amigo e só de olhar você sabe o que ele precisa? Foi isso o que aconteceu, o olhar de Luciana, e os olhos cheios de lágrimas me diziam que aquele era mais um dia difícil para minha amiga, e que ela precisava mais de mim, do que eu da minha cama. Ela me abraçou, aquele abraço que pede socorro, que passa o sentimento da pessoa meio que pela pele. Nem perguntei nada, só sentei ela na mesa de jantar, peguei a garrafa de café e coloquei para mim e para ela. Conversamos um pouco, ela desabafou, me entregou a carta que escrevera e pediu que eu  a lesse depois que ela fosse embora. Quando estava mais calma, me agradeceu por mais uma vez lhe emprestar o  ombro amigo para chorar a dor que eu já conhecia, a dor mais famosa desse mundo, que todos pelo menos uma vez na vida a sentem de verdade, e aqueles que não sentiram, esses podem dar graças aos céus, pois são muito abençoados. Luciana foi embora e voltei para a cama, liguei o abajur e li a carta. Tantos sentimentos, tantas verdades, e a certeza de que aquilo se tratava de amor, verdadeiro e dos fortes. Começava mais ou menos assim...
"Hoje iríamos completar mais um mês juntos, como todos os meses que passamos felizes, todas as vezes que nossos corações disparavam de ansiedade quando esse dia chegava e sabíamos que passaríamos o dia inteiro colados, seja um jantar, assistindo um filme, caminhando pela praça ou apenas jogando conversa fora, mas era NOSSO dia, mais um, um a mais dos milhões que desejava passar ao seu lado. Lembra quando programamos aquela viagem para a praia? Fomos escondidos, e foram os três dias mais inesquecíveis da minha vida. Cada segundo, cada palavra, cada momento me fazem morrer por dentro, de saudade, de tristeza, de felicidade por ter feito parte da sua vida. Se eu pudesse voltar no tempo, dizer mais uma vez que te amo, ouvir você dizer que me ama, evitar aquelas brigas, me arrepender por ser tão chata e orgulhosa, rir mais um pouco, dormir mais uns minutos ao seu lado, ou só ouvir você falar, colocar o ouvido no seu peito e escutar seu coração batendo, enquanto você falava que ele batia por mim, e planejava onde iria ser nossa casa, e você já tinha escolhido a cor, amarela com janelas brancas, um jardim com flores iguais as do jardim da minha avó, três cachorros, uma cama bem grande com tv no quarto, você trabalhando com seu pai, eu na clínica, e as noites matando a saudade de um dia inteiro longe um do outro. Saudades das suas mensagens no meio da noite, ou quando eu acordava e abria um sorriso tão mais tão feliz ao ler a letra daquela música que você ouviu pela primeira vez e pensou em mim, aqueles poeminhas que eu tenho certeza que você pesquisava na internet pra me mandar, porque sabia que eu achava fofo e ficava toda derretida. Eu sei que vou conseguir, mas tá tão difícil sem você, sem o seu sorriso que dava força pra superar qualquer obstáculo, briga em casa, trabalhos da faculdade, estresse, cansaço. Agora o que eu faço com tanto amor? O que eu faço com os planos, os sonhos, como caminhar sem uma perna, um braço, porque metade de mim era você, metade de mim era o que eu ia ser com você. Eu te amava por você me fazer tão feliz, por me fazer descobrir um sentimento que nunca imaginei que existisse, que nunca imaginei que pudesse caber dentro de mim, e que me fazia te amar por me fazer quem eu era quando você entrou de mansinho na minha vida e me fez evoluir de menina mimada para uma mulher. Rasguei nossas fotos porque já dói tanto as lembranças que não consigo esquecer, ficar olhando as fotos, os presentes, me dói porque você não está mais aqui, e não posso mais abraçar você. Não posso mais sentir seu coração, seu corpo quente e ouvir você dizer que nunca sentiu por mulher nenhuma o que sentia por mim, e que cada dia valia a pena porque estava comigo. Toda a dor por não te ter mais nessa vida, não chega sequer aos pés da felicidade que você me proporcionou. Sei que vou te encontrar um dia, independente do futuro que eu vou ter, independente de aparecer outra pessoa. A casa amarela com janelas brancas, o som de um coração batendo, o sorriso mais sincero que eu ver... tudo vai me lembrar você, e só de lembrar vou te sentir comigo de novo, e sorrir por EU ter feito parte da sua vida, e isso destino nenhum, acidente nenhum vai apagar. Amo você, para sempre."
 Marcelo havia sofrido um acidente fatal de carro quando ia encontrar Luciana, uma fechada em alta velocidade, capotamento e morte instantânea. Iam comemorar mais um mês de namoro, no carro encontraram um envelope amarrado em uma caixinha de jóias, era um anel de noivado. Aquele dia foi o pior que já vivi até hoje, vai fazer um ano e quatro meses que ele se foi. Aquela carta foi um acordo que fiz com ela, pra ajudar a por para fora a dor quando ela bater, minha amiga escreve as cartas e me dá para guardar numa caixa que fizemos. Não entendo porque sentimentos tão puros são interrompidos tão brutalmente, não tem como prever, não dá pra se preparar antes, não há curso no mundo que fosse capaz de preparar uma pessoa para perder metade da alma, todos seus planos e sonhos, ter sua felicidade e realidade apagada, deletada. Ninguém tá preparado. Sofrer é uma porrada independente de sermos fortes, musculosos, termos passado por maus bocados. Não dá pra imaginar, só quem sente, só quem sofre. Mas Deus tem algo para nos dizer através da dor, acredito que quando caímos assim de um abismo tão alto, É para nos prepararmos para a caminhada de volta ao topo, definitivamente. 

 A vida é uma lousa, em que o destino, para escrever um novo caso, precisa de apagar o caso escrito.
Machado de Assis

          

Nenhum comentário: